Seria um cineasta, Enzo Samuel Saldanha de Oliveira - Fotomontagem CFF/Redes sociais
O nome dele era Enzo Samuel Saldanha de Oliveira e tinha apenas 18 anos. Ainda era um estudante do ensino médio. Era também um sonhador, cheio de projetos para um futuro grandioso. Queria ser cineasta, estudar fora, ficar famoso contando coisas boas da Bahia. Mas não há mais o que contar…
No dia em que morreu, Enzo estava a caminho do Horto Florestal, mas também estava a caminho do seu sonho: estava indo encontrar o professor de teatro, Michael Oliveira, para mostrar mais um roteiro que ele havia escrito. Ele estava, há dois anos, assistindo aulas de teatro desse professor, mesmo sem estar matriculado, e gravando vídeos. Pequenos brotos do seu sonho alimentado com afinco.
Mas o sonho acabou… Perdeu para a inércia, para a política mal feita, para as mentiras nas quais o povo acredita.
Enzo amava Quentin Tarantino, um diretor de cinema famoso por filmes que contam histórias de assassinos e justiceiros. Quanta ironia… Uma das suas músicas preferidas era Construção, de Chico Buarque, uma música que narra o último dia na vida de um homem simples: um dia que começa comum, em que ele se despede da família com amor, sai de casa e não volta. “Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”, diz a música. Outra ironia.
O professor estava saindo do Horto quando foi avistado pelo amigo de Enzo, que correu em sua direção gritando “Enzo foi baleado, professor!”. Ele ficou ali, ao lado do menino, enquanto aguardava o socorro chegar. Mas não havia mais socorro a oferecer. Só os últimos minutos de companhia. “Ele morreu diante de mim, sem que eu pudesse fazer nada”, relembra Michael. Sua voz expressa dor, revolta e uma dose de culpa. “Não é culpa sua”, eu digo, mas não sei se ele me ouve. Acho que não… Ele está pensando que poderia ter sido diferente.
Enzo virou notícia na cidade, no estado, virou notícia nacional, o G1 falou de Enzo. Mas Enzo virou estatística. Somou mais um aos 27 que morreram assassinados à tiros por bandidos nesta cidade, antes dele, somente nesse começo de 2025, conforme a SSP/Ba. E ninguém está falando sobre isso. Três dias depois e os jornais não ouvem mais o choro da família; da mãe; dos amigos…
O homem que matou Enzo segue livre. Os homens que mataram as outras 27 pessoas também.
A culpa não foi sua, professor.
A culpa é dos 23 ocupantes de cadeiras na Câmara de Vereadores; a culpa é dos 21 que ocuparam as mesmas cadeiras nos últimos oito anos; a culpa é do prefeito, do ex-prefeito, do governador. A culpa é de quem tem político de estimação, seja lá a cor preferida mesmo que não faça nada. Segurança não se faz com viatura na rua, e muito menos com chacina em bairro de gente pobre. Segurança se faz com cultura forte, com emprego, com cidade limpa, com áreas de lazer e convivência, com assistência social, com identidade e pertencimento. Segurança se faz, com cuidado.
Não é justo um jovem perder a vida para um sistema político que está mais preocupado com picuinha e com cortes em redes sociais, mais preocupado em ganhar voto do que em cuidar das pessoas. Mais preocupado em fazer firula… Camaçari não avança sendo assim. E nós não podemos esquecer, nem calar; porque talvez você não esteja chorando por Enzo, mas enquanto a cidade não for boa para todos, ninguém estará seguro.
Dessa vez, foi Enzo.
Amanhã, quem?
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