86,46% das vítimas se autodeclaram negras, pretas ou pardas, evidenciando a interseccionalidade entre gênero e raça na violência doméstica (Foto: ilustrativa)
Um estudo realizado pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) revelou o perfil das vítimas de violência doméstica no estado, destacando que mulheres negras, mães e solteiras são as mais afetadas.
O levantamento, que analisou 380 processos de Medidas Protetivas de Urgência (MPUs), selecionados aleatoriamente 44.304 processos de MPU que não estavam sob segredo de justiça, aponta que 86,46% das vítimas se autodeclaram negras, pretas ou pardas, evidenciando a interseccionalidade entre gênero e raça na violência doméstica.
Perfil das vítimas: negras, jovens e mães
O estudo do TJBA mostrou que a maioria das vítimas de violência doméstica na Bahia são mulheres negras, com idades entre 30 e 39 anos (34,19%). Além disso, mais da metade delas (58,17%) têm filhos em comum com o agressor, o que reforça a complexidade das relações abusivas, muitas vezes mantidas por laços familiares. A desembargadora Nágila Brito, presidente da Coordenadoria da Mulher do TJBA, destacou a preocupação com o alto percentual de vítimas negras, que supera a média nacional. “É algo que precisa ser enfrentado com políticas públicas específicas”, afirmou.
Apesar de a violência atingir mulheres de todas as idades — com registros que vão de 12 a 89 anos —, a faixa etária mais vulnerável é a de 30 a 39 anos, seguida por mulheres de 19 a 29 anos (25,96%) e de 40 a 49 anos (22,88%). Em relação ao estado civil, a maioria das vítimas é solteira (55,34%), enquanto apenas 18,36% são casadas e 13,97% têm união estável. Uma pequena parcela é separada ou divorciada (10,14%).
Escolaridade e ocupação: desafios socioeconômicos
O estudo também revelou que a maioria das vítimas possui Ensino Médio completo (31,02%), enquanto apenas 2,14% têm pós-graduação. Um dado alarmante é que 5,88% das mulheres agredidas são não alfabetizadas, o que pode dificultar o acesso à informação e à justiça. Em 52,05% dos casos, não foi possível identificar o nível de escolaridade das vítimas, o que sugere falhas no preenchimento de dados durante os registros policiais.
No que diz respeito à ocupação, a maioria das vítimas tem alguma fonte de renda, seja como autônoma/informal (34,98%), empregada formal (29,33%) ou aposentada/pensionista (6,01%). No entanto, 35,69% não possuem ocupação remunerada, sendo 20,49% donas de casa, 4,95% estudantes e 4,24% desempregadas. A falta de independência financeira pode ser um fator que dificulta a ruptura de ciclos de violência.
Perfil dos agressores: homens negros e informais
Os agressores, em sua maioria, também são homens negros, pretos ou pardos (86,29%), com idades entre 40 e 49 anos. A maior parte atua de forma autônoma ou informal, o que pode indicar uma relação entre instabilidade econômica e comportamentos violentos. A violência ocorre principalmente à noite e está frequentemente associada a conflitos de separação (44,21%), com agressões de natureza psicológica e física.
Cenário da violência: à noite e pós-separação
O estudo apontou que a violência doméstica na Bahia ocorre principalmente à noite e está relacionada a situações de separação conjugal. A natureza das agressões varia entre violência psicológica e física, com casos extremos que chegam a colocar a vida das vítimas em risco. Um exemplo recente foi o caso de uma mulher de 46 anos, esfaqueada pelo ex-companheiro na frente do filho de 8 anos, em Salvador. O homem, que não aceitava o término do relacionamento, feriu a vítima gravemente, reforçando a necessidade de medidas protetivas eficazes.
Resposta do Judiciário e desafios
A pesquisa do TJBA buscou traçar um panorama das MPUs para melhorar a resposta do Judiciário aos casos de violência doméstica. A juíza Eduarda Vidal, integrante do Grupo de Pesquisas Judiciárias (GPJ), destacou a importância do estudo: “Os números de violência contra a mulher crescem vertiginosamente, e precisamos agir para garantir a proteção das vítimas”.
A desembargadora Nágila Brito ressaltou a necessidade de celeridade na análise das medidas protetivas, que devem ser decididas em até 48 horas, conforme previsto na Lei Maria da Penha. “Essa agilidade pode salvar vidas”, afirmou.
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