Roberto Inácio, 23, acusa servidores do Hospital Geral do Estado (HGE) de cometer transfobia. Segundo o rapaz, ele não está sendo tratado pelo seu nome social, e sim no feminino. “A situação começou já na entrada. Mostrei meu cartão do SUS com nome social e pedi para ser registrado daquela maneira. A recepcionista nem olhou para a minha cara e colocou o nome feminino lá. Desde então, só fui tratado assim. Na hora não quis discutir, pois estava com muita dor e precisava ser atendido logo”, conta ele, que sofre de anemia falciforme e está internado desde o dia 2 de março.
Roberto diz ainda que o tratamento de enfermeiros e médicos causou constrangimentos desde o momento da triagem. A princípio, ele chegou a ser internado na ala feminina da unidade de saúde, mas conseguiu ser transferido para a ala masculina depois de muita discussão. A portaria 1.820 do Ministério da Saúde, publicada em 13 agosto de 2009, possibilita o uso de nome social por pacientes da rede de saúde pública.
Ainda assim, o paciente alega que funcionários continuam se referindo a ele no feminino. “Hoje acordei com uma enfermeira dizendo: 'Ah, você é uma mulher muito bonita, traços muito femininos'”, relata ele. Houve uma queixa formal sobre o caso na ouvidoria do HGE na última quarta-feira (8).
Apesar da reclamação, o problema não foi resolvido e, segundo Roberto, a equipe de atendimento continua o tratamento no feminino. “A própria Ouvidoria, no início da resposta, me tratou como mulher. Disseram já ter orientado a equipe e que não havia mais nada a fazer”, lamenta.
O preconceito atingiu ainda o tratamento recebido. Por conta da doença, Roberto sente dores intensas. “Tenho crises graves, preciso de morfina de quatro em quatro horas. No início, eles se recusavam a dar a medicação. Depois aplicavam com intervalos longos, de seis ou oito horas. Eu chorava e gritava de dor”, recorda Roberto.
Ainda segundo Roberto, só melhorou quando Fernando Meira, médico do Trans Saúde, serviço especializado em pessoas trans, falou com a profissional que estava no plantão. De acordo com o rapaz, a queixa também foi passada à Ouvidoria, mas no documento só consta a reclamação por transfobia.
“Transfobia, infelizmente, ainda é comum. Mesmo tendo portarias, resoluções e códigos de ética profissionais, muitos funcionários do sistema de saúde colocam seus preconceitos no trabalho. A violência psicológica e a transfobia institucional nos faz adoecer ainda mais. Nem na hora da dor o nome e o gênero são respeitados”, afirma João Hugo Cerqueira, integrante do Coletivo Famílias pela Diversidade e do Conselho Estadual de Saúde Integral da População LGBT.
João e integrantes do grupo se preparam para, na segunda-feira (13), acionar instituições como o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Defensoria Pública.
Procurada pelo CORREIO, a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia respondeu, via e-mail, "que o paciente vem recebendo todos os cuidados necessários e a unidade busca assegurar aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) o direito a ser identificado e atendido pelo nome de sua preferência, conforme normatizado pela portaria 1.820 de 13 de agosto de 2009, do Ministério da Saúde. Situações contrárias a esta norma são consideradas isoladas. A direção do Hospital Geral do Estado (HGE) irá apurar os fatos e, caso necessário, implantar ajustes para o cumprimento da legislação".
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