A delação premiada de Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras, pode ajudar a esclarecer um dos mais polêmicos negócios da Petrobras, fechado no apagar das luzes do governo FHC. Trata-se da compra do grupo argentino Pérez Companc por US$ 1,1 bilhão, numa operação que teria rendido propinas de US$ 100 milhões para o PSDB, segundo declarou Cerveró em sua delação obtida pelo jornal Valor Econômico.
Anunciada em julho de 2002, no segundo semestre do último ano do segundo mandato de FHC, a operação foi duramente criticada pelos analistas de mercado. Sabia-se, naquele momento, que a Argentina, mergulhada em profunda crise econômica, estava prestes a desvalorizar sua moeda e a dar o calote nos seus títulos externos – o que de fato aconteceu. Além disso, já havia sinais claros de intervenção excessiva no mercado de petróleo.
Na época, a Petrobras era presidida por Francisco Gros, um banqueiro já falecido que havia presidido o BNDES com discurso privatista e também havia comandado o banco de investimentos Morgan Stanley. "Não estamos comprando uma galinha morta, mas uma galinha poedeira de ovos de ouro", disse ele, sobre a operação em que a Petrobras também assumia dívidas de US$ 2,2 bilhões da empresa pertencente ao bilionário Gregório Pérez Companc.
O mercado, no entanto, reagiu de forma extremamente negativa. "A empresa vinha vendendo ao mercado a idéia de que iria reduzir seu risco, mas decidiu investir num país de risco muito superior ao brasileiro", disse Edmo Chagas, que era analista do banco suíço UBS Warburg.
"Foi uma grande negociata", disparou Fernando Leite Siqueira, que era presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, a Aepet. "Nosso próximo passo será contratar avaliações internas para calcular o tamanho dessa negociata, mas estimamos que a estatal tenha pago pelo menos US$ 300 milhões a mais".
O negócio era muito criticado em razão de dados objetivos. A Perez Companc era a empresa mais endividada do setor de petróleo em todo o mundo. Seu passivo representava 73% do patrimônio. Na Petrobras, a taxa, que era de 33%, passou para 42% depois da aquisição, enquanto a média mundial era de 25%.
Além disso, no primeiro trimestre de 2002, a empresa argentina havia registrado um prejuízo de US$ 309 milhões. Com isso, a companhia estava sendo pressionada pelos credores a reestruturar sua dívida no curto prazo de US$ 1,2 bilhão.
Era uma operação que parecia tão ruim que as ações da Petrobras desabaram e o valor da estatal encolheu em US$ 1,9 bilhão, mais do que o US$ 1,1 bilhão que estava sendo pago aos Pérez Companc. "Para a Petrobras, o negócio significou uma perda de 8% em seu valor", disse o analista Cleomar Parisi, que atuava no Unibanco.
Na época, apenas um profissional da área de petróleo elogiou a operação: o ex-genro de FHC, David Zylberstajn, que comandava a Agência Nacional do Petróleo. "Foi uma bela jogada da Petrobrás. Se ela não comprasse, outra compraria, e uma excelente oportunidade de negócio seria perdida", afirmou.
A delação de Cerveró, no entanto, realimenta a polêmica sobre o caso.
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